O Beco das Garrafas já movimentava a cena pré-bossa de Copacabana desde 1953. Mas, conforme ensina o livro “A Noite do Meu Bem”, de Ruy Castro, o Bottle’s só foi inaugurado em 1961, depois que o empresário Alberico Campana comprou o Escondidinho, restaurante que funcionava no fundo do beco, e montou um novo bar para fazer companhia ao Little Club, ao Baccara e ao Ma Griffe. Quem tocou na estreia foram os jovens músicos Luizinho Eça, Helcio Milito e Bebeto Castilho, que viriam a ganhar fama como Tamba Trio.
Por coincidência, Daniela Soledade lembra que sua primeira flauta pertenceu a Bebeto (morto recentemente, em março) — o filho dele emprestou o instrumento à mãe da cantora. Filha do cantor, músico e arranjador Paulinho Soledade e neta de Paulo Soledade, parceiro e amigo de Tom e de Vinicius, Daniela está ligada ancestralmente à cena que gestou a bossa nova.
Naquele mesmo 1961 em que foi fundado o Bottle’s, Paulo Soledade abriu, a 350 metros dali, na rua Barata Ribeiro, o Zum-Zum, na verdade uma boate que marcaria a história da música brasileira a partir de shows históricos como o que reuniu Dorival Caymmi, Vinicius de Moraes e o Quarteto em Cy.
Agora, depois de excursionar por Estados Unidos e Europa, lotando espaços e conquistando plateias exigentes em templos do jazz como o Ronnie Scott’s, de Londres, e palcos de prestigio como o Sunset/Sunside, de Paris, o dueto Love & Bossa Nova, de Daniela Soledade e Nate Najar, chega ao berço da música que o levou a ganhar o mundo: o Bottle’s Bar, no Beco das Garrafas, em Copacabana, Rio de Janeiro.
Esta primeira vez nos palcos do Brasil tem um sabor especial para a cantora carioca e o violonista e guitarrista americano. Eles estão juntos na vida a dois e na carreira musical por culpa da bossa nova. Radicada na Flórida desde o fim da adolescência, ela procurava alguém que dominasse o gênero e, indicada por um amigo, encontrou no músico muito mais do que esperava.
“Fiquei impressionada com a forma como ele tocava as músicas do Tom. A gente começou a trabalhar junto e se apaixonou. Tom Jobim foi nosso cupido”, conta Daniela. Como explica, em rimas, a letra de uma das composições do casal, “Beijo no Arpoador”: “a bossa nova te trouxe pra mim/ pra mim Jobim foi o cupido e também o tamborim”.
A canção faz parte do segundo álbum de Daniela, “Pretty World”, gravado em sua maior parte no Brasil (com participações especiais do maestro e pianista Antonio Adolfo e do trompetista Randy Brecker) e lançado internacionalmente no ano passado, com ótima recepção de veículos como o “Jazz Times”. Roberto Menescal, parceiro de Daniela na faixa “Como É Gostoso Sonhar”, participou de dois shows da turnê de lançamento, nos Estados Unidos.
Nate Najar tem 14 álbuns lançados como artista solo ou líder. Ele decidiu ser músico profissional a partir do fascínio pelo som brasileiro que conheceu nos discos de Charlie Byrd (1925-1999). “Ouvi o álbum ‘Bossa Nova Pelos Pássaros’ e fiquei encantado. Depois fui escutar música brasileira e entendi de onde ele tinha tirado partes específicas dos arranjos. Daí fui ouvir João Gilberto, Baden Powell… Eu tive muita sorte”, conta Nate.
Seu mais recente disco é “Jazz Samba Pra Sempre”, lançado em 2022 para celebrar 60 anos do clássico álbum “Jazz Samba”, de Charlie Byrd e Stan Getz, marco inaugural da popularização da bossa nos Estados Unidos. Em sua jornada de admiração e culto à obra de Byrd, Nate teve contato com a viúva do guitarrista, que lhe deu o precioso violão Ramírez com que ele tocou por muitos anos. Fã dos violões Di Giorgio (gravou bastante com um Di Giorgio Tárrega, do mesmo modelo popularizado por João Gilberto), Nate atualmente usa um instrumento feito especialmente para ele, mas com elementos do Di Giorgio Author 3 usado por Baden Powell, outra de suas maiores influências.
Assim como Nate toca e produz os discos de Daniela, ela participa de “Jazz Samba Pra Sempre” cantando em duas faixas: “É Luxo Só”, de Ary Barroso, e “O Pato” (de Jaime Silva e Neuza Teixeira). As duas canções devem fazer parte do set list do Bottle’s e dos demais shows no Brasil, junto com “Double Rainbow” (“Chovendo na Roseira”) e “Pra Que Discutir com Madame” (Janet de Almeida e Haroldo Barbosa).
Daniela e Nate formataram o dueto Love & Bossa Nova a partir da experiência que tiveram durante a pandemia. Depois de ter um show cancelado, resolveram compensar a frustração fazendo uma live no Facebook. Daí em diante, virou rotina, por mais de um ano, todas as sextas, às 19h, eles se apresentavam na web, traçando em formato bossa um repertório que ia de Cartola a Ivan Lins, contando a história e contextualizando a importância dos autores e intérpretes associados ao repertório.
O show do dueto Love & Bossa Nova que roda o mundo (e que vai seguir por datas nos EUA em julho e agosto) tem formato intimista. Mas a noite no Bottle’s será especial: o público vai ver metade da apresentação em duo, só Daniela e Nate, e metade com participação do pai de Daniela, Paulinho Soledade, no baixo, e Claudinho Infante, na bateria, uma cozinha com décadas de ótimos serviços prestados à música brasileira. Os dois gravaram grande parte do álbum “Pretty World” que, assim como o disco de estreia de Daniela (“A Moment of You”), faz uma ponte entre três gerações da família Soledade. No território sagrado da bossa, entre possíveis canjas e surpresas, não poderá faltar uma versão especial para a marcha-rancho “Estão Voltando as Flores” (clássico de Paulo Soledade), um hino eterno para felizes retornos.
Dia: 13 de junho (terça-feira)
Horário: 21 hrs (a confirmar)
Ingresso: R$50 (a confirmar
Local: Bottles no Beco das Garrafas em Copacabana
Endereço: Rua Duvivier, 37 – Lojas J, K, L – Copacabana, Rio de Janeiro – RJ, 22020-020, Brasil