Do folk ao fado, Vasco Ribeiro & Os Clandestinos lança segundo álbum, “Formas de Estar”
Com 13 faixas, o grupo lisboeta traz novos ares à música popular portuguesa
Vasco Ribeiro & Os Clandestinos por Rita Caldeira
Entre quartos desarrumados, uma casinha velha perto dos campos do Gerês (a norte de Portugal) e os lendários estúdios Namouche, em Lisboa, é que o grupo Vasco Ribeiro & Os Clandestinos gravou o disco que edita agora: “Formas de Estar”. O álbum foi assim intitulado por duas razões: por representar diferentes fases de crescimento e estados de espírito – algumas músicas foram feitas com espaço de seis anos entre elas –, e por trazer em sua essência diferentes gêneros musicais tais como folk, pop, fado e bossa. “Queremos despertar no ouvinte formas amplas de sentir, sejam elas peculiares ou dessemelhantes”, conta Vasco Ribeiro. Ouça aqui.
Logo após terem lançado o primeiro álbum de originais, “Mais Um Dia”, em 2020, o grupo com base em Lisboa começou a pensar no que viria a ser o próximo. Havia músicas antigas que tinham ficado na gaveta, e muitas outras que foram criadas durante o período de pandemia – assim foi formado o repertório de “Formas de Estar”. Com as bases prontas e grande parte dos arranjos planejados, a banda foi para os estúdios Namouche, inaugurados em 1973, e por onde passaram nomes como Zeca Afonso, Sérgio Godinho, Fausto e Jorge Palma, que coincidentemente integram a lista de referências do disco. “Foi um processo eletrizante e de entusiasmo infantil. Éramos um grupo de músicos e amigos movidos pelo ideal de estarem a criar algo genuíno. Buscamos fazer um disco o mais dinâmico e diversificado possível, e penso que esse objetivo foi concretizado”, diz Vasco Ribeiro.
Para além dos elementos base que constituem o projeto ao lado de Vasco Ribeiro – Francisco Nogueira, Rafael Castro, Henrique Rosário e António Gonçalves –, participaram do disco novos Clandestinos e Clandestinas, que devem também integrar concertos futuros. Dentre eles estão o cantor, compositor e flautista Gabriel Pepe; os saxofonistas João Arez e André Monteiro; o trompetista italiano Samuele Lauro; o ex-integrante da banda Steven Gillon; e o coro de vozes formado por Constança Branco e Carlota Loureiro.
Capa por Vasco Ribeiro com lettering por Rita Caldeira – download aqui
Capa
A partir de uma colagem feita por Vasco Ribeiro com fotografias de todas as pessoas que de alguma forma participaram da construção do álbum é que foi realizada a capa, que apresenta também ilustrações dos singles já lançados. O lettering do título foi feito pela designer Rita Caldeira, e o artwork do interior do álbum físico foi feito por Mariana Fraga, que também auxiliou na capa. “A ideia da capa é algo a roçar o imaginário dos Monty Python. A fotografia de fundo é uma paisagem do Gerês, lugar encantado onde me refugio desde muito cedo para compor e refletir no meio da natureza. A arte consiste num amontoado de pessoas e influências que fizeram com que o álbum ganhasse vida”, divide Vasco Ribeiro.
Faixa a faixa
O disco tem início com Voz Interior, uma das canções mais folk do repertório, e que apresenta instrumentos tradicionais portugueses como o adufe. “Esta é uma das músicas mais antigas do projeto e fala sobre aventura e descoberta individual”, diz Vasco Ribeiro.
Já Vida de Cão – assista lyric video, uma música de protesto inspirados na sonoridade dos anos 70 e cantautores como Sérgio Godinho, conta uma história real, acrescida de alguns elementos ficcionais. “Tenho um amigo chamado Francisco, um sem-abrigo com quem me encontrava nas ruas desertas, principalmente durante o período da pandemia. Ele partilhou comigo muitas das suas peripécias de vida que o levaram a viver na rua há já mais de 5 anos.”
Meu Corpo Vai, uma das canções mais complexas do álbum, possui grandes arranjos de sopros e de coro de vozes, além de alguma sonoplastia incorporada à mistura. “É uma música que se poderá enquadrar no gênero do world music, o que quer isso signifique, e que trata sobre a perda e sobre o recomeço.”
Um dos singles a antecipar o disco, Canas Soltas – assista videoclipe, traz uma história passada às margens do rio Tejo e conta com um videoclipe realizado por Henrique Montalvão. “Esta canção, um folk tradicional com um toque modernista, utiliza instrumentos pouco habituais no projeto, como o acordeão e a cabaça. A narrativa é sobre a obsessão de um jovem que se apaixona por uma rapariga que vê passar na rua, e também sobre peripécias da cidade de Lisboa.”
A única bossa do álbum, Primavera – assista vídeo, é uma música doce, com interpretação de Henrique Rosário no piano, Francisco Nogueira no contrabaixo, e um solo de saxofone alto de André Monteiro. “Ao contrário de todas as outras, esta foi composta por Rafael Castro, com letra minha. É uma ode a esta maravilhosa estação e a comparação desta, até certo ponto, com um estereótipo de mulher primaveril.”
Avenida Morta foi escrita na quarentena e tem inspiração na sonoridade e na poética de Chico Buarque. “Representa um grito de esperança e de liberdade, e fala sobre como essa liberdade pode ser tão frágil. Diferente das outras, esta canção foi gravada em um só take, com todos a tocar ao mesmo tempo para tirar o maior partido do sentimento da música.”
Em Qualquer Um Cantor, temos uma história sobre os sonhadores que deambulam pelas cidades. “Se os Beatles tivessem feito um fado, possivelmente poderia soar a algo parecido com esta canção – os mais atentos vão perceber o porquê. Fala de forma um pouco abstrata sobre a busca incessante da veia artística e individual de cada um. É mais um poema cantado do que uma canção propriamente dita.”
Primeiro single do álbum a ser lançado, O Sonho ganhou para a versão do disco uma nova mistura e masterização. Entre as diferenças sonoras está o trompete de Samuele Lauro, músico italiano que, durante uma breve passagem por Lisboa, conheceu Vasco enquanto este tocava na rua, no Miradouro de Santa Luzia. “Esta é talvez uma das músicas mais pessoais do disco, escrita no início da pandemia, sobre as ansiedades e medos de ser um jovem num mundo que se apresenta tão confuso e polarizado.”
O Homem Que Falava Demais – assista vídeo foi o último e principal single do álbum, além de ser a faixa mais pop. “Esta música fala dos extrovertidos e dos introvertidos. Sobre os que falam demais quando estão bem e saudáveis, e sobre os que por necessidade ou feitio, falam de menos. Sobre o que escuta, e também sobre o que quer ser ouvido.”
Faixa mais experimental do projeto, Deita-te é repleta de sonoplastia e brincadeiras sonoras, com influência de Zeca Afonso no refrão, e beat criado com guitarra que acompanha toda a música. “A letra longa, corrida e poética, de temática abrangente, traz influências literárias como Henry David Thoreau, Homero, Platão e George Orwell, além de reflexões sobre o estado do mundo e sobre como o capital cria uma sociedade cada vez mais desigual de opressores e oprimidos.”
Sombra do Meu Ser é uma balada romântica que apresenta um lado mais sentimentalista do disco. “Trata sobre o fim da relação de um primeiro amor, a dor do coração partido, o salto no abismo. Tem a interpretação exímia de Henrique Rosário no piano e de Francisco Nogueira no contrabaixo, e uma orquestração de quarteto de cordas no final da música feita por Steven Gillon, com recurso a VST ‘s.”
Lançada em 2023, Nada Em Especial – assista vídeo é inspirada no irish folk de bandas como The Pogues, e tem participação especial de Carlota Loureiro que, além de fazer parte do coro de vozes de músicas do disco, canta aqui lado a lado com Vasco Ribeiro. “Na perspectiva utópica de um sonhador, esta música é uma odisseia rápida e abstrata sobre a história da evolução humana.”
Lia Anarquista, uma bonus track, finaliza o álbum com diversão e descontração. Tal como “Avenida Morta”, foi gravada em um só take. “Conta uma história fictícia, baseada em factos reais, que segue uma jovem anarquista e as suas aventuras tão peculiares. Faz lembrar, até certo ponto, a vibe dos Mamonas Assassinas, com guitarras intencionalmente altas.”
OUÇA AQUI
MATERIAL PROMO AQUI
FICHA TÉCNICA
Composição, Letra, Voz e Guitarra Acústica: Vasco Ribeiro
Guitarra Elétrica: Rafael Osório de Castro
Baixo e Contrabaixo: Francisco Nogueira
Piano, Teclados e Acordeão: Henrique Rosário
Bateria e Percussões: António Gonçalves
Shaker e VST’s: Steven Gillon
Flauta Transversal/Bansuri: Gabriel Pepe
Saxofone Alto: André Monteiro
Saxofone Tenor: João Arez
Trompete: Samuele Lauro
Voz em “Nada Em Especial”: Carlota Loureiro
Segundas Vozes: Carlota Loureiro, Constança Branco e Gabriel Pepe
Coro: Carlota Loureiro, Constança Branco e Vasco Ribeiro & Os Clandestinos
Captação, Mistura e Masterização: Bernardo Centeno
Produção: Vasco Ribeiro & Os Clandestinos
Estúdio: Namouche e Camaleão (nas vozes principais de “Nada Em Especial”)
LINKS
SOBRE VASCO RIBEIRO & OS CLANDESTINOS
Vasco Ribeiro & Os Clandestinos é um projeto de música popular portuguesa que se caracteriza pela voz do cantor e compositor Vasco Ribeiro como forte componente lírico, e pela diversidade sonora dos Clandestinos. Sediada em Lisboa, a banda que acompanha o vocalista é atualmente constituída por Francisco Nogueira (baixo e contrabaixo), Rafael Castro (guitarra elétrica e segundas vozes), Henrique Rosário (teclas e acordeão) e António Gonçalves (bateria e percussões).
Iniciado em 2018, o projeto une a música tradicional portuguesa ao folk moderno, com forte influência do cancioneiro português e letras complexas de perspicácia singular. Influenciados por nomes da MPP como Zeca Afonso, Sérgio Godinho, José Mário Branco e Jorge Palma; e da MPB, como Caetano Veloso e Chico Buarque; e até por cantautores franceses e italianos, seguindo o princípio de que a música e a arte devem servir o propósito de unir pessoas e alimentar o espírito humano.
Em 2020, lançaram o primeiro álbum de originais, “Mais Um Dia”; seguido dos singles “O Sonho”, “Primavera”, “Vida de Cão”, “Canas Soltas” e “Nada em Especial”. Agora preparam-se para os concertos de lançamento do segundo disco, “Formas de Estar”.