Memórias
Já perceberam como somos ligados por fios invisíveis à todas as coisas que já vivemos na vida?
Chamamos isso de memória e ela funciona com todos os nossos cinco sentidos do corpo, se ligando aos sentidos da alma.
I am outside
And I’ve been waiting for the sun
With my wide eyes
I’ve seen worlds that don’t belong
Não faz muito que eu fiz aniversário. Aquele último 01/11 amanheceu ensolarado do lado de fora da janela e nublado por dentro.
Desde os 25, quando a famosa crise existencial bateu pela primeira vez, eu não gosto mais de fazer aniversário. Foi, e ainda é, uma soma de frustrações empilhadas e sonhos interrompidos.
Naquele dia essas pequenas cordinhas da memória ficavam me puxando, quase arrastando de volta para alguns lugares que, se antes eram memórias boas, hoje são mais e mais camadas que ficam pra baixo da pele.
Algumas eram tão fortes que, quase visíveis, eu já não entendia se estava alucinando ou não. Foi nesse dia, quando acordei cedo e peguei a bicicleta, que me vi sendo obrigado pelos meus próprios fantasmas a visitar seus túmulos, quase como se fosse o dia seguinte do calendário: Finados.
My mouth is dry
With words I cannot verbalize
Tell me why
We live like this
Não temos a capacidade de controlar estes momentos, as memórias agem em conjunto com o tempo, são impossíveis de se impedir e cabe a nós podermos usar deles da forma mais proveitosa, para que as lembranças que nos envolvam nos tragam paz, mesmo que nem sempre sejam agradáveis.
A pequena vantagem que temos é de que o tempo vai sabotando a mente, e com isso vamos perdendo a precisão do vídeo que passa diante dos olhos, ficando apenas com a essência do que o momento te trouxe.
Um perfume ou um pôr do Sol vão reativar apenas essas sensações, sejam de contentamento ou dor, e isso nos abre a possibilidade de refazer alguns poucos passos em algumas poucas situações, no melhor estilo efeito borboleta.
Cause we are broken
What must we do to restore
Our innocence
And all the promise we adored?
Give us life again
Cause we just wanna be whole
Foi o que aconteceu naquela quarta-feira, que coincidentemente era um dia de folga pra mim. Visitar locais de momentos felizes que se tornaram tristes com o tempo foram, de certa forma, fatores de cura.
Nesse caso, é impossível mudar aquela lembrança, impossível mudar o que foi vivido ali, impossível não ver com uma certa nostalgia inclusive, como aquilo que era um símbolo de felicidade perdeu o sentido e mesmo assim eu consegui fazer as pazes com aquele lugar, comigo mesmo, com o branco dos muros, o toque da grama, o descanso dos bancos e até com insegurança do ambiente, coisa que não era preocupação há dez anos. E paz era tudo o que eu precisava.
Lock the doors
Cause I’d like to capture this voice
It came to me tonight
So everyone will have a choice
Uns chamam de epifania, outros de nirvana, outros de redenção, mas eu chamei de paz.
É aquele entendimento de que tudo o que se precisa fazer, ou sentir, ou ser, já está nas nossas mãos, e finalmente conseguimos ligar aquela luz, partir de um princípio para seguir o caminho que precisa ser trilhado, e principalmente, nos sentirmos capazes de trilhar esse caminho.
Cada assunto inacabado que vai ficando é um muro que colocamos no caminho, e muitos muros transformam um campo aberto em labirinto, sufocante e difícil de sair.
É uma luta de todos os dias transformar muros em pontes, fazer novas conexões e transformar em positivas as vibrações que vêm por esses fios.
A nossa alma funciona muito melhor quando não fragmentada.
And under red lights
I’ll show myself it wasn’t forged
We’re at war
We live like this
Esses pequenos desencontros fazem com que a gente se encontre, com que a gente respire e aproveite cada segundo.
Viver tudo isso deixou os meus sentidos literalmente mais aguçados. O calor do sol na pele, uma foto de um momento bom, o sabor da comida da minha avó, até o cheiro de filhote que a Celeste ainda tem quando acorda, e principalmente a música, que há muito tempo é catalisador de todos os momentos da minha vida e que funciona como uma viagem no tempo pessoal, para que eu possa usar e afinar as mesmas cordas na memória conforme o que estiver tocando.
Foi necessário me cercar de coisas que me fizessem entender a capacidade que temos de reconstrução pra poder ter isso como objetivo e seguir adiante com a melodia que rege a trilha sonora da vida.
Keep me safe inside
Your arms like towers
Tower over me
A gente não precisa ter vergonha de ser feliz, assim como não precisa ter vergonha de estar triste, ou reflexivo, ou nostálgico.
A única paz que possibilita todas as outras é a paz interior, é estar inteiro, se fazer inteiro, e paz não é sinônimo de euforia, mas de plenitude.
Eu espero que 2018 te traga plenitude, nos traga plenitude, seja qual for o caminho e a forma de andar por ele que tenhamos.
Thomas Krause, 14/01/2018.
And I’ll take the truth at any cost
We are Broken – Paramore