Cresci ouvindo música por influência dos meus pais e irmã na primeira metade da década de 80, algo já relatado em colunas anteriores. Sempre com interesse em pegar aquelas bolachas com encartes grandes e lendo os créditos puramente para querer descobrir sobre artistas, pessoas envolvidas na gravação, agradecimentos… agindo naturalmente para ter pleno conhecimento de detalhes dos artistas e suas obras. Ao final desta mesma década comecei a ouvir música mais pesada (Heavy Metal) e assimilar alguns de seus conceitos. Eu era o garoto na escola que gostava de Rock mas não tinha cara de quem gostava, era difícil encontrar alguém com gosto similar mas quando acontecia era um alívio poder compartilhar as histórias dos artistas favoritos numa época pré-MTV. Havia álbuns de figurinhas com temas de surf e skate que também continham cromos com bandas, seus logotipos e capas dos álbuns – eram ilustrações certas nos meus cadernos da escola. Rock era a válvula de escape, a saída para as incertezas e transformação da pré para a adolescência. Era anarquia e rebeldia sonorizada, era onde a gente sentia a energia emanada das bandas e fazia arrepiar ao ouvir cada acorde ou cada riff. Era onde a gente viajava ao colocar os fones de ouvido no quarto escuro ao ouvir programas de Rock na Rádio Fluminense FM e também com as fitas cassete e os discos de vinil. Era o estilo de música que estava bastante popular no início dos anos 90 onde os festivais ainda faziam jus à palavra “Rock” em seus nomes.
É de conhecimento geral que a minha banda de metal favorita é o Metallica, já ficou claro por aqui. Era uma utopia na adolescência querer se tornar um músico e ter competência para tocar tais músicas, parecia uma tarefa impossível fazer o riif inicial de “One” mesmo com tablatura, por exemplo. Restava tentar atos mais fáceis, como Ramones e Sex Pistols. Essas três bandas foram pioneiras em seus estilos, foram divisores de águas e mudaram o curso da história da música em suas épocas. Nos shows independentes ainda víamos muitas tribos assistindo shows (ou estragando shows… risos)… metalheads ou headbangers (chamados bisonhamente de “metaleiros” por aqui), punks, skatistas, carecas – havia vários grupos associados com determinados tipos de música, o que era automaticamente rotulado como um movimento. Bandas como Cólera, Inocentes e Ratos de Porão lideraram o movimento punk nos anos 80 no Brasil com discursos nada otimistas sobre religião, política e as desgraças e adversidades de se viver num país afundado numa crise num barco guiado por uma ditadura militar que durou 21 anos. Era época de muita repressão e censura, mas havia um discurso sério e engajado que as pessoas bradavam e cantavam como hinos. A própria Legião Urbana no início de carreira possuía este cunho de protesto, vide que a música “Que País É Este” é atemporal e é trilha sonora de contestação de qualquer manobra política escusa até hoje. “Amazônia Nunca Mais” do Ratos de Porão retrata o que o homem faz em nome do progresso.
Ratos de Porão – “Amazônia Nunca Mais”
Vivíamos uma época que o Rock se expressava contra o poder, contra o sistema. O público ecoava os discursos e assumia essas mensagens como suas ideologias por um país com um futuro menos tortuoso. Havia garra, havia suor, havia poder nas palavras. O Rock era a mensagem das ruas transportada por guitarras distorcidas aos ouvidos daqueles que viviam no ostracismo. Já dizia a letra de “Pela Paz” do Cólera: “Têm vinganças religiosas, Têm vinganças de raças, Têm vinganças de governos, Tenho medo da guerra – Mas quem se importa? Eu me importo, eu me importo! Pela paz, pela paz, pela paz em todo o mundo!”. Só o Rock poderia proporcionar à época uma mensagem tão direta e eternizada na discografia do Cólera e infelizmente também nos acontecimentos cotidianos pelo mundo. Capivarock recomenda e muito que ouçam este disco prestando atenção nas letras.
Cólera – “Pela Paz em Todo Mundo” (álbum completo)
Não mencionando como se fosse regra, mas o século XXI chegou e alguns conceitos também mudaram. A indústria musical sofria o duro golpe do advento da música digital e iniciava seu planejamento de reconstrução, as gravadoras e os artistas se reinventando e se adaptando aos novos tempos em que o consumo de música passava por drásticas e irreversíveis mudanças. No aspecto musical do início do século, não podemos afirmar a falta de talento e criatividade ou justificar o fracasso de uma vertente musical em detrimento do sucesso de outra. Víamos os artistas Pop mais bem sucedidos comercialmente do que artistas de Rock – não é uma crítica, mas vemos pelos artistas Pop surgidos nesta época e a perpetuação de bandas de Rock mais antigas. Não tenho pretensão de ser radical a ponto de achar que uma pessoa sempre terá que ouvir as mesmas músicas e mesmos artistas antigos até o fim da vida, é claro que o público se renova e há novas coisas para se buscar e descobrir algumas surpresas no gosto pessoal, vemos hoje em dia o domínio avassalador da música sertaneja universitária (o que quer que isso seja) em terra brasilis. O pagode também não fica atrás, claro.
Há certos parâmetros e referências que passamos a ter com o tempo. Fazendo uma análise rápida de como os jovens (admito que quem usa a palavra “jovens” para se referir aos jovens já se entregou à velhice…risos) da geração digital, os 21st century digital boys (salve Bad Religion) em sua maioria não usam calças rasgadas (quando usam, não vale comprada já rasgada), camisas de bandas, patches de bandas nos bonés, tênis All Star de preferência desbotados ou furados. O que dita a tendência é aquele cordãozão de ouro, tênis extravagantes, boné de aba reta e camisas com estampas gigantes. Posso estar errado na descrição do vestuário pois eu realmente não entendo, mas é fato de que a juventude atual tem como referência de identidade visual e de mensagens de protesto o Rap. É claro que não sou ingênuo de achar que isso vem de agora. O Rap, acrônimo de “rima e poesia” em inglês, sempre teve cunho de protesto desde seus primeiros registros. Nota da coluna: Capivarock não dispõe de conhecimento aprofundado no estilo, com isso serão relatados apenas algumas informações no contexto do enredo. Milhares de palavras são proferidas por minuto galgadas num ritmo que é impossível não contagiar de alguma forma. Na época que eu comecei a ouvir Rock, os nomes unânimes do Rap eram RUN DMC e Public Enemy. Ambos são associados em sua trajetória com o Rock dividindo músicas com Aerosmith (“Walk This Way”) e Anthrax (“Bring The Noise”) respectivamente.
RUN DMC – “Walk This Way” (participação de Aerosmith)
Anthrax e Public Enemy – “Bring The Noise”
João Pedro, meu filho de 9 anos de idade, assiste vídeos no YouTube como a maioria das crianças da idade dele. Gameplays são os vídeos favoritos, mas há música também. E reparando algumas coisas que ele ouve/assiste, vejo que muitas crianças de sua faixa etária possuem as mesmas preferências. Ele me citou três exemplos que nos dias de hoje poderíamos até chamar de digital influencers, mas creio que neste contexto o termo musical influencers seria mais adequado: Haikaiss, Costa Gold e MC Marechal, três artistas de rap. O grupo Haikaiss nem é tão novo assim, possui 10 anos de existência com quatro álbuns lançados e já se apresentou nos festivais Planeta Atlântida e Lollapalooza. Costa Gold também possui quatro álbuns lançados desde de 2011. MC Marechal fez parte do grupo Quinto Andar (do clássico “Melô do Piratão”), já gravou com Marcelo D2l e também atua como produtor musical. A questão em comum desses artistas é que são três fenômenos de visualizações dos seus videoclipes no YouTube. Em números, o clipe oficial do Haikaiss da música “RAP LORD” tem 73 milhões (sim, eu falei MILHÕES) de visualizações desde seu lançamento há 7 meses. A faixa “Sexy Lady” de Costa Gold possui pouco mais de 22 milhões de visualizações, também lançado há 7 meses. E vários vídeos do MC Marechal que não estão em seu canal oficial também estão na casa dos milhões de visualizações. A garotada nascida a partir dos anos 2000 tem esses artistas e outros vários como referência, é a música que eles consomem e que toda a galera deles consome, são grupos que todos querem ir assistir os shows, exatamente como acontecia comigo no final dos anos 80 com bandas de Heavy Metal. Os clipes recheados de ostentação e vida boa dos rappers podem ser os maiores responsáveis pelos sonhos dos garotos, igual a aqueles que jogam futebol e veneram Cristiano Ronaldo e Messi na esperança de um dia serem ricos e famosos como eles.
Haikaiss part. Jonas Bento – “RAP LORD”
Costa Gold – “Sexy Lady”
Mas eu particularmente não vejo uma banda de Rock em escala nacional ou mundial que tenha surgido a partir dos anos 2000 e que sempre se manteve no topo, sem deixar a peteca cair. É claro que pode haver algumas, mas parece que são pouquíssimas. Não é uma crítica negativa à qualidade das bandas pois há inúmeros artistas que têm muito potencial (inclusive comercial), mas qual é o futuro do Rock? Será que um dia veremos o jogo virar e o Rock voltará à elite musical? Há alguma esperança de que o Rock volte a ser uma filosofia de vida para os jovens de uma geração? A mídia voltará a apoiar o Rock para que volte a ser a música das massas? Estas são perguntas que eu assumo que não tenho otimismo em responder “sim”… mas não é um receio da minha parte pois as novas gerações tendem sempre a mudar seus hábitos e costumes. E não sinto o Rock ameaçado, pois enquanto houver algum(a) garoto(a) se arrepiando ou cantarolando um riff, o estilo continuará perpetuado! João Pedro falou de Haikaiss, Costa Gold e MC Marechal mas devorou uma biografia ilustrada dos Beatles que dei para ele, além da camisa da capa do disco “Yellow Submarine” é a sua favorita e é usada frequentemente. Que orgulho do meu filho! Eis um exemplo prático e caseiro de que o Rock nunca morrerá! 🙂
Por Fellipe Madureira
Colaboração: João Pedro M. Freire
Na vitrola: Liam Gallagher – “Wall of Glass”
Adoro rap e rock ! Sempre gostei dos dois, até porque comecei a ouvir música de “adulto” ( antes eu só tinha fitas infantis da época, trem da alegria e etc) comprando uma fita do Furacão 2000 e o tinha algumas coisas de rap. E um dos primeiros vinis que eu comprei foi do grupo de rap 2 Live Crew, so por causa das músicas Melô da Mulher Feia e Melô dos números, que na época foram feitas versões em português por cantores de funk carioca e que eu ouvia muito por influência dos amigos. E gostava !!!! Mas depois dessa minha fase inicial, o rock me me pegou se vez através de bandas como os Guns & Roses, Poison, Skid Row, Bon Jovi ( é… eu adorava rock “farofa” rsrsrs), U2, Oingo Boingo e demais bandas que tocava muito na rádio e na MTV. Ahhh e o Rap, nunca deixei de escutar, passei a conhecer mais outros estilos de rap e curtir mais ! Vida longa aos rock e ao RAP !