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Rock in Rio parte 2 – festival da diversidade

Rock in Rio parte 2 – festival da diversidade

Imagem da internet

Ainda no clima do maior festival de música do Brasil, seguimos na segunda parte sobre o Rock in Rio! Neste fim de semana a edição 2017 termina com shows mais dedicados ao Rock. No fim de semana passado, a música Pop teve seu destaque. Acompanhei alguns shows pela TV (infelizmente AINDA não fui credenciado para cobrir o evento… risos)  e destaco a grande apresentação do Chic no Palco Sunset. Este palco tem a filosofia de apresentar parcerias inusitadas ou algumas relativamente óbvias, como foi o caso desta do Chic com Nile Rodgers. Ao encerrar o show do Frejat no Palco Mundo, as câmeras já captavam a área do Sunset lotada e foi uma viagem no tempo. Dono de uma técnica impecável do Funk propriamente dito (não esses funks cariocas), Nile e Chic conseguiram levantar e sacudir o público como se estivessem nos bailes Disco nos anos 70 com direito a passinho e tudo da galera! Precisei fazer esta menção, porém o foco do assunto de hoje não é resenhar shows. Encerrei a coluna de semana passada com a seguinte frase “E você, já pensou fora da caixa?”. Vamos dissertar em cima dela iniciando com a polêmica envolvendo o coadjuvante que passou a ser protagonista mesmo sem estar no line-up: Pabllo Vittar e homossexualidade no Rock.

 

 

Pabllo Vittar, nome artístico de Phabullo Rodrigues da Silva, nasceu em 1994 no Maranhão e é um dos artistas mais populares do Brasil que vem ganhando cada vez mais notoriedade, a ponto de ser convidado para várias parcerias como o hit “Sua Cara” com Anitta que lidera as principais paradas musicais no país. A aparição de Pabllo Vittar no show da Fergie no dia 16 (sábado) incendiou uma apresentação relativamente morna – o conceito do show de Fergie talvez não tenha sido o formato ideal para o festival ou para o entendimento do público do Rock in Rio – e a própria Fergie, numa reação possivelmente constrangedora, fez juras de amor a Pabllo para conquistar a plateia. Após o show, Pabllo foi entrevistado ao vivo pelo canal que transmite o evento e usava uma blusa da banda Bad Religion, banda punk californiana com quase 40 anos de estrada. Redes sociais se inflamaram divididas em opiniões, uns dizendo que ele nem fazia ideia do que era Bad Religion e se referiram a ele pejorativamente. Minhas caras capivaras, pensemos com frieza: se a camisa da sua banda independente ou de alguma banda sem muita expressão ou relevância fosse usada em cadeia nacional pelo artista popular, seja ele de qual gênero for, é um problema para você? Vocês já imaginaram o marketing gratuito por despertar a curiosidade de quem quer saber o que está escrito na camisa, especialmente numa era em que qualquer coisa que se quer saber as pessoas vão ao Google buscar? Ah, vocês têm medo de associar sua banda a um artista drag queen? Lembrem-se que estamos em 2017!

 

https://youtu.be/gi-qIon_rO8

 

Diversidade é algo muito discutido no Rock in Rio, seja ela artística ou de orientação sexual. A quantidade de reclamações das pessoas em relação ao Rock in Rio não ter Rock é imensurável. A grande questão nem é as pessoas gostarem de reclamar, mas lembrarem que gosto pessoal é algo individual e que o Rock in Rio NUNCA, eu disse e repito: NUNCA foi um festival de Rock. Algum festival exclusivo de Rock aqui no Brasil tem longevidade? Creio que há boa vontade de poucos e sérios produtores com o Rock, nos anos 90 ainda trouxeram o Monsters of Rock pra cá mas passado o tempo, o festival não voltou mais. Vamos mais uma vez pegar o DeLorean de Marty McFly e voltar exatamente à época que esta máquina do tempo foi criada: 1985. Vocês conhecem o line-up completo da primeira edição do Rock in Rio? Vejam a imagem abaixo e certifiquem-se de que só tinha Rock nesta edição:

 

 

Pois bem, vejam quem abriu o festival: Ney Matogrosso. No mesmo dia teve Erasmo Carlos, Baby Consuelo e Pepeu Gomes, artistas que não eram essencialmente do Rock. Eles até usaram trajes teoricamente associados ao Rock, mas sem muita naturalidade. Segundo dia do festival: Ivan Lins, Elba Ramalho, Gilberto Gil, Al Jarreau, James Taylor e George Benson. Rock? Terceiro dia, The Go-GO’s. Rock? Nos outros dias Alceu Valença, Moraes Moreira e Eduardo Dusek. Rock? Rod Stewart e Ozzy Osbourne no mesmo dia, alguém imaginaria? Estamos falando de um festival de música cujo nome não é literal. É uma marca criada com cunho comercial e que foi um divisor de águas no país, pois como dito na coluna anterior, o Brasil não era um local considerado em turnês de artistas internacionais. Isso abriu o mercado para muita gente: empresários, artistas nacionais e até aquele garoto que como eu amava o Metallica e o Bad Religion e se influenciou a montar uma banda por ver várias bandas ao vivo.

Na segunda edição tivemos Jimmy Cliff, New Kids on The Block, Deee-Lite, Debbie Gibson, Information Society e George Michael representando a parcela não-Rock do festival. Em 2001 tivemos N’Sync, Britney Spears, Sandy e Junior, Carlinhos Brown, Milton Nascimento, Aaron Carter e outros. Continuando: 2011 tivemos Elton John, Rihanna, Stevie Wonder, Claudia Leitte, Shakira, Ke$ha e Jamiroquai; em 2013: Beyoncé, Ivete Sangalo, David Guetta, Alicia Keys; em 2015, Seal, Sam Smith, Cidade Negra. Rock na essência? Não. Foi sucesso de público? Sim! Rock in Rio é uma marca consolidada e um case de sucesso.

Talvez uma das melhores definições que eu ouvi sobre este festival foi da minha amiga produtora Paula Puga: o Rock in Rio vende a experiência, não a música. É um pacote gigante com inúmeras atrações e opções de lazer. Empresas se adaptaram às mudanças de comportamento e economia de um país e com o Rock in Rio não é diferente. O valor do ingresso pode não ser popular, mas considerando a quantidade de atrações num mesmo dia não se pode considerar um valor exorbitante. Aí você pensa: “eles não têm coerência em colocar atrações diferentes num mesmo dia”… você já parou e pensou como empresário e não como espectador? Não existe melhor fórmula para obter receita para bancar o festival.

Na coluna sobre Festivais de Rock, citei o Roskilde da Dinamarca. O Metallica tocou pela primeira vez em 1986, quando começava a ascender sua popularidade. Sabem quem tocou no mesmo dia que eles? Eric Clapton, Phil Collins, Madness e Elvis Costello. Nenhum desses artistas tinham qualquer compatibilidade musical com o Metallica. Talvez a grande questão da discussão dos dias de hoje se canalize nas bandas de Rock que tocaram na primeira edição do festival, que eram as principais na época e deixaram uma marca positiva, mas erraram ao perpetuar o nome do festival como algo exclusivo. Diversidade, meu amigo!

 

 

O tema diversidade também chega num assunto não agradável na nossa sociedade: homofobia. Os homossexuais sempre foram julgados e hostilizados. No mundo do Rock, dito como uma terra de “machos”, parece inadmissível haver participação de gays num festival de Rock como o Rock in Rio. Ops! Mas o Rock in Rio não é um festival de Rock… ter um show cuja atração principal é um artista venerado pelos gays gerou uma enxurrada de críticas, muitos dizendo “o Rock in Rio não tem mais Rock”.

Vamos retornar novamente ao ano de 1985. Vocês sabem dizer qual era o principal nome desta edição? Queen, cujo vocalista é o Freddie Mercury. Alguém discorda que Queen era banda de Rock? Cazuza se apresentou com o Barão Vermelho também nesta edição. Judas Priest, um dos maiores nome do Heavy Metal mundial, tocou em 1991 com seu vocalista Rob Halford que é homossexual. E pensar que no século XXI a gente vê admiradores da música cada vez mais andando para trás considerando um problema estes artistas serem escalados para o festival. É muito triste pois o Rock in Rio promove uma das poucas oportunidades de trazer numa mesma época vários artistas de vários estilos.

O retrocesso artístico é uma das maiores catástrofes da sociedade moderna. Outros estilos também marcaram presença no festival com artistas homossexuais, como por exemplo George Michael, Cassia Eller, Elton John, Adam Lambert (com o Queen) e Pet Shop Boys. O Rock in Rio é ecumênico, não há como fugir disso! No último domingo zapeando o Netflix, encontrei um documentário chamado Who The Fuck Is That Guy? The Fabulous Journey of Michael Alago. Michael Alago era um garoto porto-riquenho radicado em Nova York, homossexual, que se transformou num A&R (Artista e Repertório) dos mais respeitados do mundo da música, tendo trabalhado em gravadoras gigantes como a Elektra e Geffen. No seu currículo, artistas como Metallica, White Zombie, Nina Simone e outros. O documentário é narrado pelo próprio Alago e convidados, vale muito a pena assistir para entender muita coisa e assimilar um pouco de história (http://www.imdb.com/title/tt4958390/).

 

 

Estamos falando de um festival de porte grande, claro. Se você acha que o Rock in Rio precisa ter mais Rock e mais bandas de Rock nacionais, é preciso dar sua contribuição e apoiar o circuito local de bandas da sua cidade! Chovem festivais por aí que privilegiam o trabalho autoral, pois se público sempre apoiar as bandas locais pode despertar o interesse de produtores e quem sabe elas passarão a fazer parte destes festivais ou criar mais festivais só de Rock no Brasil? Ou quem sabe, para satisfazer o desejo de quem reclama que não tem Rock, o Rock in Rio passe a ser exclusivo de Rock se utilizando desta lógica? A mudança está em você, seja parte dela! 😉

 

Por Fellipe Madureira

Na vitrola: Judas Priest – “Painkiller”

3 comentários

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Anderson Firmino

Nunca foi só de rock. E sinceramente gosto da diversidade do festival. Por muitos anos cai no erro de achar que esse festival deveria ser só de Rock. Não caio mais nesse erro.

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Eli

Viva a diversidade! Não a homofobia!!!
Parabéns por pensar fora da caixa.

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Digão

É isso, mano. Colocações perfeitas. A mudança começa em cada um de nós.
Parabéns pela coluna. Tá show!!!